Por Priscila Rangel de Souza, Fernanda Marques e Tamara Otsuru Augustinho Teixeira
- Contexto
A navegação de pacientes é uma abordagem inovadora e multidisciplinar no cuidado de saúde que visa guiar os pacientes através do complexo sistema de cuidados médicos. Este conceito surgiu nos Estados Unidos na década de 1990, com o objetivo de melhorar o acesso e a adesão ao tratamento, especialmente para populações vulneráveis, incluindo aqueles que enfrentam barreiras socioeconômicas e culturais (1,2).
O conceito foi desenvolvido pelo Dr. Harold P. Freeman, um cirurgião oncológico e defensor dos direitos dos pacientes. Teve início no Harlem Hospital Center em Nova York, onde o Dr. Freeman implementou o primeiro programa de navegação de pacientes em 1990. Sua motivação surgiu da observação de que muitos pacientes oncológicos, especialmente aqueles de comunidades de baixa renda, tinham um maior índice de desfechos desfavoráveis quando comparados à população com maior poder aquisitivo. Identificou que pacientes de baixa renda demoravam mais para iniciar seu tratamento e ainda muitos não conseguiam dar sequência em sua terapia, devido a uma série de obstáculos, sendo os principais a falta de conhecimento sobre o sistema de saúde, barreiras financeiras, transporte, e questões relacionadas à comunicação e cultura. Mediante a esse cenário, a fim de diminuir as disparidades e melhorar os desfechos clínicos dessa população, a navegação de pacientes foi, portanto, concebida como uma estratégia para ajudá-los a superar esses obstáculos e garantir que eles recebessem o tratamento necessário de maneira oportuna e eficaz (1,2).
A navegação de pacientes, surge então como uma estratégia de extrema relevância na saúde, pois atua diretamente nas desigualdades no acesso aos cuidados de saúde. Fornece apoio personalizado e adaptado às necessidades de cada paciente. Além disso, ajuda a diminuir as desigualdades na saúde, assegurando que todos os pacientes, independentemente de sua situação socioeconômica e cultural, tenham acesso ao melhor atendimento possível (2,3).
Os navegadores de pacientes, que podem ser profissionais da saúde (navegadores clínicos , mais comumente enfermeiros e assistentes sociais) ou outros profissionais (navegadores não-clínicos, que recebem treinamento básico em Oncologia e capacitação em navegação de pacientes), trabalham para identificar barreiras ao cuidado e desenvolver estratégias para superá-las, ajudando os pacientes a se movimentarem de forma eficiente através de um sistema de saúde por vezes fragmentado e difícil de percorrer. Aos pacientes, representa um avanço significativo na abordagem ao cuidado de saúde, especialmente em áreas complexas como a oncologia. Ao reduzir barreiras e promover um acesso equitativo aos cuidados, não apenas melhora os resultados clínicos, mas também oferece suporte vital para os pacientes em momentos de extrema vulnerabilidade (2,3,4).
No Brasil, a evolução da navegação pode ser observada também por meio das diretrizes do governo nacional. Em 2016, o Projeto OncoRede da Agência Nacional de Saúde Suplementar aborda a necessidade da coordenação do cuidado, assim como de indicadores de jornada do paciente oncológico (5). O Programa Nacional de Navegação de Pacientes para Pessoas com Neoplasia Maligna de Mama, em 2021 visava atenuar as barreiras institucionais, socioeconômicas e pessoais durante o tratamento do câncer, com o intuito de proporcionar um cuidado de qualidade ao paciente oncológico (6). A Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e o Programa Nacional de Navegação da Pessoa com Diagnóstico de Câncer, instituída em 2023, amplia a atuação da navegação a pacientes diagnosticados com outros tipos de câncer (7).
2. Benefícios da Navegação de Pacientes
A Navegação de pacientes é uma estratégia de coordenação de cuidado que propicia benefícios para as pessoas com câncer, familiares e instituições. Em todas as fases do continuum de cuidados oncológicos, desde a prevenção, suspeita, diagnóstico, tratamento ativo, sobrevivência, aos cuidados de fim de vida, o profissional Navegador atua com abordagem centrada no paciente, nos seus valores e suas preferências, objetivando atingir o melhor desfecho para cada paciente (8)
A adequada operação do processo de Navegação prevê a utilização dos recursos diagnósticos e terapêuticos em tempo e ordenação oportunos, mitigando o intervalo de tempo entre suspeita, diagnóstico e início do tratamento. Todos os procedimentos necessários são monitorados pelo navegador e, com essa coordenação, o paciente apresenta uma melhor experiência durante sua jornada pelo complexo e fragmentado sistema de saúde, delimitando menor grau de sofrimento e mais confiança para avançar em sua jornada (8,9).
Por meio do alinhavar das diversas etapas e profissionais envolvidos na jornada oncológica, a Navegação impacta em desfechos favoráveis aos pacientes e familiares tais como o maior entendimento de sua situação de saúde e das etapas de sua jornada de cuidados, a maior desenvoltura emocional para tomar decisões compartilhadas com a equipe e consequentemente, na maior adesão ao plano de tratamento acordado (8,9,10,11).
Navegando em conformidade com os Padrões da Prática Profissional de Navegação Oncológica estabelecidos pela Academy of Oncology Nurse & Patient Navigators e respeitando os Princípios da Navegação de Pacientes descritos por Harold Freeman, benefícios como melhores desfechos clínicos, melhor experiência do paciente e retorno sobre investimento tem sido descritos nos programas de Navegação em Enfermagem (12, 13, 14). Os principais benefícios incluem:
- Redução do Tempo para Diagnóstico e Tratamento: A navegação confere maior agilidade para diagnóstico, reduzindo o tempo entre a identificação dos sintomas e o início do tratamento. Isso é crucial para melhorar os resultados do tratamento em oncologia, visto que o diagnóstico precoce alcança maiores taxas de cura e que o câncer é uma doença tempo-sensível.(12).
- Aumento do Conhecimento e da Adesão dos Pacientes: Enfermeiros navegadores educam os pacientes e cuidadores, proporcionando uma melhor compreensão do diagnóstico e do plano de tratamento. Isso contribui para uma maior adesão ao tratamento e ao seguimento recomendado (13).
- Melhoria na Qualidade de Vida: Com avaliação contínua, os pacientes experimentam uma melhora na qualidade de vida durante o tratamento oncológico, pois recebem cuidados multiprofissionais, orientação e suporte emocional para enfrentar os desafios associados ao diagnóstico e tratamento do câncer
(14). - Redução de Custos para o Sistema de Saúde: A navegação reduz a necessidade de visitas ao pronto-socorro e readmissões hospitalares, resultando em uma diminuição dos custos para as instituições de saúde (14).
3. O Enfermeiro como Protagonista na Navegação de Pacientes
Passadas três décadas da criação do primeiro programa de navegação de pacientes com câncer no mundo, estudos reforçam cada vez mais o papel fundamental do enfermeiro na navegação de pacientes. O enfermeiro navegador acolhe os pacientes e utiliza-se do processo de Enfermagem para identificar barreiras ao cuidado oportuno e de qualidade, avaliar as necessidades individuais de cada paciente e assim, elaborar um plano de navegação com intervenções que mitigam barreiras, coordenam os cuidados multiprofissionais e educam os pacientes sobre seus direitos, sistema de saúde, diagnóstico e tratamento, favorecendo a tomada de decisão informada de pacientes e seus familiares (15).
Com uma abordagem centrada no paciente e conhecimento clínico em Oncologia, enfermeiros navegadores são aptos a atuar como o elo de ligação entre paciente, equipe e instituição de saúde. Na posição de profissional referência para o paciente, o enfermeiro navegador centraliza as informações e orientações de cada paciente, estabelecendo as prioridades de cuidado, monitorando a adesão a consultas, exames, procedimentos e tratamentos, a evolução dos cuidados multiprofissionais, garantindo assim, a continuidade e a qualidade do cuidado que impactam em desfechos (15).
Enfermeiros navegadores são considerados essenciais para melhores resultados para pacientes com câncer mas também para uma melhor experiência dos pacientes nesta jornada que, para muitos deles, é a mais difícil de suas vidas.Eles desempenham um papel especialmente relevante nas fases nas quais questões clínicas e cuidados complexos são as principais necessidades. Destaque é conferido a atuação do Enfermeiro Navegador ao intervir para eliminar obstáculos ao acesso oportuno aos cuidados paliativos e manejo humanizado e ético dos anseios e angústias associados ao luto e terminalidade frente à necessidade (8,11).
O enfermeiro oncologista navegador exerce um papel fundamental para melhores resultados em saúde ao proporcionar coordenação e suporte em todas as fases do continuum de cuidados oncológicos, desde a prevenção até os cuidados paliativos. É notório o protagonismo do enfermeiro na navegação de pacientes em oncologia, sua atuação é essencial para contribuir para o controle do câncer aliado à humanização do cuidado(12,15).
Referências Bibliográficas
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