Preencha o login e senha para cadastrar uma nova pesquisa clínica ou para editar os dados de uma nova pesquisa já inserida.
São permitidos apenas um login e senha por instituição.
Associado(a), por favor utilize seu CPF cadastrado na SBOC. Caso não se lembre ou não tenha cadastrado antes, entre em contato pelo e-mail [email protected].
Por Priscila Rangel de Souza, Fernanda Marques e Tamara Otsuru Augustinho Teixeira
A navegação de pacientes é uma abordagem inovadora e multidisciplinar no cuidado de saúde que visa guiar os pacientes através do complexo sistema de cuidados médicos. Este conceito surgiu nos Estados Unidos na década de 1990, com o objetivo de melhorar o acesso e a adesão ao tratamento, especialmente para populações vulneráveis, incluindo aqueles que enfrentam barreiras socioeconômicas e culturais (1,2).
O conceito foi desenvolvido pelo Dr. Harold P. Freeman, um cirurgião oncológico e defensor dos direitos dos pacientes. Teve início no Harlem Hospital Center em Nova York, onde o Dr. Freeman implementou o primeiro programa de navegação de pacientes em 1990. Sua motivação surgiu da observação de que muitos pacientes oncológicos, especialmente aqueles de comunidades de baixa renda, tinham um maior índice de desfechos desfavoráveis quando comparados à população com maior poder aquisitivo. Identificou que pacientes de baixa renda demoravam mais para iniciar seu tratamento e ainda muitos não conseguiam dar sequência em sua terapia, devido a uma série de obstáculos, sendo os principais a falta de conhecimento sobre o sistema de saúde, barreiras financeiras, transporte, e questões relacionadas à comunicação e cultura. Mediante a esse cenário, a fim de diminuir as disparidades e melhorar os desfechos clínicos dessa população, a navegação de pacientes foi, portanto, concebida como uma estratégia para ajudá-los a superar esses obstáculos e garantir que eles recebessem o tratamento necessário de maneira oportuna e eficaz (1,2).
A navegação de pacientes, surge então como uma estratégia de extrema relevância na saúde, pois atua diretamente nas desigualdades no acesso aos cuidados de saúde. Fornece apoio personalizado e adaptado às necessidades de cada paciente. Além disso, ajuda a diminuir as desigualdades na saúde, assegurando que todos os pacientes, independentemente de sua situação socioeconômica e cultural, tenham acesso ao melhor atendimento possível (2,3).
Os navegadores de pacientes, que podem ser profissionais da saúde (navegadores clínicos , mais comumente enfermeiros e assistentes sociais) ou outros profissionais (navegadores não-clínicos, que recebem treinamento básico em Oncologia e capacitação em navegação de pacientes), trabalham para identificar barreiras ao cuidado e desenvolver estratégias para superá-las, ajudando os pacientes a se movimentarem de forma eficiente através de um sistema de saúde por vezes fragmentado e difícil de percorrer. Aos pacientes, representa um avanço significativo na abordagem ao cuidado de saúde, especialmente em áreas complexas como a oncologia. Ao reduzir barreiras e promover um acesso equitativo aos cuidados, não apenas melhora os resultados clínicos, mas também oferece suporte vital para os pacientes em momentos de extrema vulnerabilidade (2,3,4).
No Brasil, a evolução da navegação pode ser observada também por meio das diretrizes do governo nacional. Em 2016, o Projeto OncoRede da Agência Nacional de Saúde Suplementar aborda a necessidade da coordenação do cuidado, assim como de indicadores de jornada do paciente oncológico (5). O Programa Nacional de Navegação de Pacientes para Pessoas com Neoplasia Maligna de Mama, em 2021 visava atenuar as barreiras institucionais, socioeconômicas e pessoais durante o tratamento do câncer, com o intuito de proporcionar um cuidado de qualidade ao paciente oncológico (6). A Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e o Programa Nacional de Navegação da Pessoa com Diagnóstico de Câncer, instituída em 2023, amplia a atuação da navegação a pacientes diagnosticados com outros tipos de câncer (7).
2. Benefícios da Navegação de Pacientes
A Navegação de pacientes é uma estratégia de coordenação de cuidado que propicia benefícios para as pessoas com câncer, familiares e instituições. Em todas as fases do continuum de cuidados oncológicos, desde a prevenção, suspeita, diagnóstico, tratamento ativo, sobrevivência, aos cuidados de fim de vida, o profissional Navegador atua com abordagem centrada no paciente, nos seus valores e suas preferências, objetivando atingir o melhor desfecho para cada paciente (8)
A adequada operação do processo de Navegação prevê a utilização dos recursos diagnósticos e terapêuticos em tempo e ordenação oportunos, mitigando o intervalo de tempo entre suspeita, diagnóstico e início do tratamento. Todos os procedimentos necessários são monitorados pelo navegador e, com essa coordenação, o paciente apresenta uma melhor experiência durante sua jornada pelo complexo e fragmentado sistema de saúde, delimitando menor grau de sofrimento e mais confiança para avançar em sua jornada (8,9).
Por meio do alinhavar das diversas etapas e profissionais envolvidos na jornada oncológica, a Navegação impacta em desfechos favoráveis aos pacientes e familiares tais como o maior entendimento de sua situação de saúde e das etapas de sua jornada de cuidados, a maior desenvoltura emocional para tomar decisões compartilhadas com a equipe e consequentemente, na maior adesão ao plano de tratamento acordado (8,9,10,11).
Navegando em conformidade com os Padrões da Prática Profissional de Navegação Oncológica estabelecidos pela Academy of Oncology Nurse & Patient Navigators e respeitando os Princípios da Navegação de Pacientes descritos por Harold Freeman, benefícios como melhores desfechos clínicos, melhor experiência do paciente e retorno sobre investimento tem sido descritos nos programas de Navegação em Enfermagem (12, 13, 14). Os principais benefícios incluem:
3. O Enfermeiro como Protagonista na Navegação de Pacientes
Passadas três décadas da criação do primeiro programa de navegação de pacientes com câncer no mundo, estudos reforçam cada vez mais o papel fundamental do enfermeiro na navegação de pacientes. O enfermeiro navegador acolhe os pacientes e utiliza-se do processo de Enfermagem para identificar barreiras ao cuidado oportuno e de qualidade, avaliar as necessidades individuais de cada paciente e assim, elaborar um plano de navegação com intervenções que mitigam barreiras, coordenam os cuidados multiprofissionais e educam os pacientes sobre seus direitos, sistema de saúde, diagnóstico e tratamento, favorecendo a tomada de decisão informada de pacientes e seus familiares (15).
Com uma abordagem centrada no paciente e conhecimento clínico em Oncologia, enfermeiros navegadores são aptos a atuar como o elo de ligação entre paciente, equipe e instituição de saúde. Na posição de profissional referência para o paciente, o enfermeiro navegador centraliza as informações e orientações de cada paciente, estabelecendo as prioridades de cuidado, monitorando a adesão a consultas, exames, procedimentos e tratamentos, a evolução dos cuidados multiprofissionais, garantindo assim, a continuidade e a qualidade do cuidado que impactam em desfechos (15).
Enfermeiros navegadores são considerados essenciais para melhores resultados para pacientes com câncer mas também para uma melhor experiência dos pacientes nesta jornada que, para muitos deles, é a mais difícil de suas vidas.Eles desempenham um papel especialmente relevante nas fases nas quais questões clínicas e cuidados complexos são as principais necessidades. Destaque é conferido a atuação do Enfermeiro Navegador ao intervir para eliminar obstáculos ao acesso oportuno aos cuidados paliativos e manejo humanizado e ético dos anseios e angústias associados ao luto e terminalidade frente à necessidade (8,11).
O enfermeiro oncologista navegador exerce um papel fundamental para melhores resultados em saúde ao proporcionar coordenação e suporte em todas as fases do continuum de cuidados oncológicos, desde a prevenção até os cuidados paliativos. É notório o protagonismo do enfermeiro na navegação de pacientes em oncologia, sua atuação é essencial para contribuir para o controle do câncer aliado à humanização do cuidado(12,15).
Referências Bibliográficas
Por Dra. Andrea Pereira e Rafael Deminice
A Sociedade Americana de Oncologia Clínica afirma que “Profissionais de oncologia devem recomendar a prática regular de exercícios físicos durante o tratamento ativo com intenção curativa”, porque uma de suas diretrizes mostra que o exercício físico é seguro e deve ser incluído como parte do tratamento de pacientes com câncer. Essa prática durante o tratamento oncológico está associada a um baixo risco de eventos adversos e pode trazer muitos benefícios. (1)
Recomenda-se a inclusão de exercícios aeróbicos e de força muscular para pacientes em tratamento oncológico, com o objetivo de mitigar efeitos colaterais como fadiga, ansiedade, depressão, além de ajudar a manter a capacidade cardiorrespiratória e a força muscular. Quando praticado no período pré-operatório, o exercício reduz o tempo de internação pós-operatória e complicações pós-cirúrgicas. (1)
No Brasil, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, com o apoio da Sociedade Brasileira de Atividade Física e Saúde e do Instituto Nacional de Câncer, publicou as Recomendações Brasileiras de Atividade Física em Oncologia, orientando profissionais de saúde sobre a importância da inclusão de exercícios físicos na rotina de pacientes com câncer. (2,3) Entre outros benefícios, estudos mostram a redução do risco de mortalidade por causas oncológicas para câncer de mama, cólon-reto e próstata de 38%. (4)
A prática de atividade física regular durante o tratamento oncológico ocasiona uma melhora metabólica-hormonal através da redução da glicose, insulina e estrógeno; redução da inflamação através de queda de IL6 e PCR; além de uma melhor perfusão e normalização da vascularização tumoral permitindo maior absorção de quimioterapia. (5,6) Além disso, o exercício melhora a resposta da quimio, radio e imunoterapia, como também, reduz os seus efeitos colaterais. (6)
Praticar ao menos 150 minutos/semana de exercício físico de intensidade moderada ou 75 minutos/semana de intensidade vigorosa ou uma combinação equilibrada entre elas é a recomendação para um efeito significantemente positivo durante o tratamento. Importante salientar que essa prática também auxília no controle da obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares, associadas a efeitos secundários do tratamento, a diferentes tipos de câncer e risco de mortalidade. (7,8)
Devemos indicar atividade física para a maioria dos pacientes, de preferência ao início do diagnóstico, porém existem algumas contra-indicações de acordo com as seguintes alterações: medulares (plaquetas<50.000; Hb<10 g/dL e neutrófilos < 0.5.109/L); musculares (score de Karnofsky <605, fadiga extrema, caquexia grave com perdas >35% do peso); infecciosas (quadro agudo, mal estar grave e febre> 37.7 0C); gastrointestinais (naúsea grave, desidratação, vômitos e diarreía dentro de 24h); pulmonares (dispnéia, tosse e dor torácica respiratório dependente); neurológicas (ataxia, declínio cognitivo significativo, desorientação e visão turva); cardiovasculares (FC>100 bpm ou <50 bpm; PAS > 145 mmHg e/ou PAD > 95 mmHg, arritmias e edema em membros inferiores). (9)
Atualmente, o exercício físico é visto como uma estratégia completa na prevenção do câncer, durante o tratamento e no período de sobrevivência, com poucas contra-indicações. O profissional de saúde tem um papel fundamental no incentivo ao início ou manutenção da prática regular durante e após o tratamento. O posicionamento das Sociedades Médicas reforçam a segurança e a evidência científica do exercício físico que aumenta a sobrevida, reduz complicações e efeitos adversos, e melhora prognóstico do paciente oncológico.
Referências:
1. Ligibel JA, Bohlke K, May AM, Clinton SK, Demark-Wahnefried W, Gilchrist SC, et al. Exercise, Diet, and Weight Management During Cancer Treatment: ASCO Guideline. J Clin Oncol [Internet]. 2022;JCO2200687.
2. Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica;, Gomes IN de CJA, Silva; D, Saúde SB de AF e. Atividade Física E Câncer: Recomendações Para Prevenção E Controle. 2022. p. 1–57.
3. Clínica; SB de O, Câncer; IN de, Saúde SB de AF e. Recomendações de atividade física durante e após tratamento oncológico [Internet]. 2023. p. 1–33.
4. Mctiernan A, Friedenreich CM, Katzmarzyk PT, Powell KE, Macko R, Buchner D, et al. Physical Activity in Cancer Prevention and Survival: A Systematic Review. Med Sci Sport Exerc. 2018;1252–61.
5. Koelwyn GJ, Quail DF, Zhang X, White RM, Jones LW. Exercise-dependent regulation of the tumour microenvironment. Nat Publ Gr [Internet]. 2017;17(10):620–32.
6. Kathleen DX, Ashcraft A. Exercise as Adjunct Therapy in Cancer. Semin Radiat Oncol [Internet]. 2018;29(1):16–24.
7. Rock CL, Thomson C, Gansler T, Gapstur SM, McCullough ML, Patel A V., et al. American Cancer Society guideline for diet and physical activity for cancer prevention. CA Cancer J Clin. 2020;70(4):245–71.
8. Patel A V., Friedenreich CM, Moore SC, Hayes SC, Silver JK, Campbell KL, et al. American College of Sports Medicine Roundtable Report on Physical Activity, Sedentary Behavior, and Cancer Prevention and Control. Med Sci Sports Exerc. 2019;51(11):2391–402.
9. Stefani L, Galanti G, Klika R. Clinical Implementation of Exercise Guidelines for Cancer Patients : Adaptation of ACSM ’ s Guidelines to the Italian Model. J Funct Morphol Kinesiol Concept. 2017;2(4):1–17.
Por Martamaria Ribeiro, Karla Rodrigues, Leonardo Bonfim e Islania Brandão Barbosa
A crescente disponibilidade de terapias antineoplásicas orais está transformando o tratamento do câncer. Essas terapias representam uma mudança significativa em relação aos tratamentos intravenosos tradicionais, oferecendo maior comodidade e qualidade de vida aos pacientes. No entanto, a ampla utilização dessas terapias traz desafios importantes, especialmente em relação ao uso racional dos medicamentos, definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a situação em que os pacientes recebem medicamentos adequados às suas necessidades clínicas, nas doses apropriadas, pelo tempo necessário, ao menor custo possível¹.
O Brasil enfrenta uma realidade complexa quanto ao acesso a novas tecnologias de tratamento do câncer, particularmente no que se refere às terapias orais. Pacientes tanto do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto de planos de saúde suplementar frequentemente enfrentam barreiras no acesso a medicamentos inovadores. Essa dificuldade se deve à morosidade na incorporação de novas tecnologias, à ausência de cobertura adequada para testes genômicos e ao alto custo dos medicamentos, o que leva muitos pacientes a recorrerem à judicialização para obter acesso2,3.
O tratamento domiciliar com medicamentos orais oferece vantagens ao paciente, como maior autonomia e conforto. Entretanto, exige maior responsabilidade por parte do paciente, que deve gerenciar corretamente a administração das doses, bem como lidar com possíveis efeitos adversos. Nesse contexto, o papel do farmacêutico se torna fundamental, uma vez que ele é o profissional que oferece suporte ao paciente na gestão do tratamento, monitoramento dos resultados e intervenções necessárias para evitar complicações 4,5.
Oncologia de Precisão e a Expansão das Terapias Orais
Nos últimos anos, a oncologia de precisão tem promovido uma revolução no tratamento do câncer. Essa abordagem utiliza informações detalhadas sobre as alterações moleculares e genéticas dos tumores para selecionar terapias personalizadas, capazes de atingir diretamente as células cancerígenas, com menores danos às células normais. As terapias-alvo, que incluem inibidores de tirosina quinase (TKIs), são um exemplo dessa inovação. Essas drogas inibem receptores celulares responsáveis pelo crescimento tumoral, como o receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFR) e o receptor do fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGFR)6,7.
Os inibidores de tirosina quinase representam um avanço significativo, pois muitas dessas moléculas estão disponíveis em formulação oral, proporcionando aos pacientes um tratamento eficaz que pode ser administrado em casa. Entretanto, a evolução da medicina de precisão no Brasil enfrenta obstáculos, principalmente relacionados ao acesso. A realização de testes genômicos para identificar as alterações moleculares nos tumores, essenciais para a escolha dessas terapias, possui um alto custo que, em grande parte, não é coberto pelos planos de saúde nem pelo SUS8. Além disso, o processo de incorporação de novas tecnologias no SUS é lento, pois envolve longas avaliações farmacoeconômicas e de custo-benefício9.
A figura abaixo demonstra a evolução do número de biomarcadores preditivos de resposta a terapias-alvo, evidenciando o impacto da oncologia de precisão no tratamento de diferentes tipos de câncer.
Figura 1. Evolução histórica do número de biomarcadores (genes) preditivos de resposta a terapias-alvo (fármacos) e aprovados para diferentes neoplasias (tumores).
Fonte: FERREIRA, et al. 20228.
Conforme a oncologia de precisão avança, o número de terapias orais disponíveis também aumenta, destacando a importância de políticas públicas que ampliem o acesso a essas inovações.
O Papel do Farmacêutico no Gerenciamento das Terapias Orais
Com o crescimento no número de prescrições de terapias orais, aumenta também a responsabilidade do farmacêutico no acompanhamento do paciente. O sucesso de uma terapia oral não depende apenas da prescrição correta, mas também do monitoramento contínuo do uso, da identificação precoce de efeitos adversos e da promoção da adesão ao tratamento. Um dos principais desafios enfrentados pelos pacientes em tratamento com terapias orais é a baixa adesão. Estudos indicam que a falta de adesão pode levar à redução significativa na eficácia do tratamento e à piora dos resultados clínicos. A adesão inadequada pode ocorrer por vários motivos, como esquecimento, efeitos colaterais não tratados e falta de compreensão da importância do tratamento10.
Nesse sentido, o papel do farmacêutico é crucial. Ele atua na orientação dos pacientes, esclarecendo dúvidas sobre a forma correta de administração dos medicamentos e alertando sobre a importância de seguir rigorosamente o plano terapêutico. Além disso, o farmacêutico é responsável por identificar problemas de adesão e implementar estratégias que ajudem a minimizar esses problemas, como o uso de ferramentas tecnológicas, lembretes e suporte educacional4.
Outro aspecto importante do papel do farmacêutico é o monitoramento de toxicidades. As terapias orais frequentemente estão associadas a efeitos colaterais significativos, como náuseas, fadiga, diarreia e dor. O farmacêutico, em colaboração com a equipe médica, pode ajustar as doses dos medicamentos e oferecer orientações sobre como gerenciar esses sintomas. Isso inclui intervenções como mudanças na dieta, uso de medicamentos de suporte e, quando necessário, modificação do regime terapêutico5.
Inovações Tecnológicas e o Monitoramento das Terapias Orais
Com os avanços tecnológicos, o monitoramento das terapias orais em oncologia tem sido facilitado por ferramentas digitais. Aplicativos móveis, como Medisafe e MyTherapy, permitem que os pacientes registrem a administração dos medicamentos, recebam lembretes automáticos e acompanhem os efeitos colaterais. Esses aplicativos têm mostrado aumentar a adesão ao tratamento, já que oferecem um acompanhamento contínuo, mesmo fora do ambiente hospitalar 11.
Dispositivos vestíveis (wearables), como smartwatches, monitoram em tempo real parâmetros de saúde do paciente, como frequência cardíaca e níveis de atividade física. Esses dados podem ser integrados a sistemas de saúde, permitindo que os profissionais de saúde façam ajustes no tratamento com base em informações precisas e atualizadas sobre o estado do paciente. Além disso, o uso de Big Data e Inteligência Artificial (IA) tem permitido análises detalhadas sobre a resposta ao tratamento e previsões sobre possíveis complicações, otimizando as decisões clínicas12.
A telemedicina, por sua vez, tem se tornado uma ferramenta essencial para o monitoramento remoto dos pacientes. Consultas virtuais permitem que os profissionais de saúde acompanhem o paciente em tempo real, avaliem toxicidades e ofereçam suporte contínuo, reduzindo a necessidade de visitas presenciais e aumentando a satisfação do paciente13.
Considerações Finais
O cenário das terapias orais em oncologia no Brasil ainda enfrenta muitos desafios, mas também oferece grandes oportunidades de inovação e crescimento. O farmacêutico, como parte integrante da equipe de saúde, desempenha um papel essencial na garantia de que essas terapias sejam administradas de forma segura e eficaz, promovendo uma melhor qualidade de vida para os pacientes.
A capacitação contínua dos farmacêuticos é vital para que eles possam acompanhar os avanços na oncologia de precisão e nas tecnologias de monitoramento, oferecendo um cuidado personalizado e centrado nas necessidades dos pacientes. Ao mesmo tempo, é crucial que políticas públicas sejam desenvolvidas para ampliar o acesso a essas terapias e garantir que todos os pacientes, independentemente de sua situação econômica, possam se beneficiar das inovações no tratamento do câncer.
Referências
Por Maria Clara Rodrigues e Islania Brandão Barbosa
A revolução científica ocorrida a partir de meados do século XX impactou profundamente o setor da saúde, incluindo a Oncologia. Desde então, esforços têm sido dedicados ao desenvolvimento e aprimoramento das práticas de prevenção, triagem, diagnóstico, tratamento e reabilitação oncológica, culminando no cenário atual. A demanda por tratamentos inovadores e eficazes tem crescido à medida que a sociedade avança e reivindica seus direitos, especialmente o direito à saúde integral. Contudo, persistem lacunas e desafios que precisam ser superados para que todos os atores envolvidos — pacientes, profissionais de saúde, governos, prestadores de serviço e operadoras de saúde — possam participar de uma equação que se torna cada vez mais onerosa.
Na Oncologia, o acesso a medicamentos ocupa um lugar central. Trata-se de uma área sensível, em que o impacto de terapias potencialmente capazes de prolongar a vida do paciente é inegável. No entanto, a realidade está longe de ser ideal. Há uma disparidade gritante entre o acesso proporcionado pelos sistemas público e privado, com o último enfrentando pressões financeiras crescentes. Enquanto antineoplásicos convencionais causavam diversos eventos adversos severos, as terapias imunológicas e celulares mais recentes oferecem tratamentos mais direcionados e eficazes, melhorando a qualidade de vida dos pacientes. De acordo com o IQVIA Institute for Human Data Science, os custos globais com terapias oncológicas atingiram US$ 223 bilhões em 2023 e a previsão é que cheguem a US$ 409 bilhões até 2028. Além disso, novos tratamentos, como terapias celulares e genéticas, conjugados de anticorpos e terapias com radioligantes, têm ganhado espaço significativo, representando cerca de 25% dos ensaios clínicos em 2023. Esses tratamentos inovadores são mais precisos, mas sua adoção global é desigual devido a variações nos testes de biomarcadores e na capacidade de infraestrutura para entregar essas terapias avançadas¹.
Nesse cenário, questiona-se: apenas o acesso a esses tratamentos inovadores é suficiente? Estudos apontam que o valor em saúde deve ser apreciado de forma mais ampla, incluindo dimensões clínicas, sociais, organizacionais e econômicas. A Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) surge como uma ferramenta sistemática e multiprofissional que almeja, através de ferramentas próprias, estabelecer as implicações diretas e indiretas de uma ferramenta aplicada à saúde². As metodologias para essa avaliação podem se adequar a diversos propósitos e categorias, desde um folheto informativo para educação ao paciente até um equipamento para cirurgia robótica. Contudo, diante da urgência em equilibrar essa balança, notoriamente os medicamentos assumem destaque.
Embora as análises farmacoeconômicas não doutrinem a utilização das tecnologias, elas oferecem subsídios para o entendimento da sua possibilidade de incorporação e sustentabilidade. Habitualmente, a análise de custo-efetividade é a mais utilizada. Enquanto os modelos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de novos medicamentos vislumbram a projeção de tecnologias que ofereçam melhores resultados clínicos, por outro lado, o lançamento de novas tecnologias na Oncologia movimenta os players em busca de negociações que sejam minimamente favoráveis às operações, visto que os modelos de remuneração estão cada vez mais estreitos. Assim, a análise de custo-efetividade compara tecnologias e resulta na razão de custo-efetividade incremental (RCEI), de modo que esse fator tende a nortear ações e prioridades no uso de tecnologias com custos e desfechos distintos. Ainda existem algumas limitações, incluindo a necessidade de explorar mais a qualidade de vida como um desfecho, tão discutida na entrega de valor em saúde. Outro desafio também seria definir um limite custo-efetividade, ainda inexistente no Brasil3.
Apesar de a ATS ter sido pensada inicialmente, em todo o mundo, como uma forma de delinear o processo de análise das novas tecnologias e gerenciar as incorporações no serviço público, que historicamente sempre lidou com a escassez de recursos4,5, essa atividade se adequa perfeitamente ao contexto do cenário privado, que discute cada vez mais essa prática. Contudo, as metodologias comumente utilizadas ainda precisam alcançar as particularidades nessa esfera. Sendo assim, algumas adaptações tendem a ser realizadas para atender aos serviços privados que, individualmente, possuem características únicas.
Na ausência de uma homogeneidade metodológica, o farmacêutico surge com um papel de destaque por se tratar de um profissional que compreende as nuances dos medicamentos. A base técnico-científica deste profissional tende a agregar as propostas e os métodos adotados para integrar as informações de diversos times de uma empresa e gerar valor em saúde. O simples entendimento das informações de estabilidade de um medicamento, do prazo de validade de um frasco com comprimidos após aberto ou da possibilidade de fracionamento de uma forma farmacêutica contribuem para que processos ocorram com cautela, da melhor forma possível e evitando desperdícios que impactarão diretamente nos resultados de toda uma empresa.
Ademais, as competências técnicas do profissional farmacêutico na avaliação de novas tecnologias vão além do conhecimento sobre medicamentos, uma vez que incluem a capacidade de analisar, interpretar e aplicar dados científicos e clínicos na otimização terapêutica, permitindo um olhar diferenciado na análise da eficácia, segurança e performance das tecnologias utilizadas. Deve-se mencionar que o Uso Racional de Medicamentos é uma das premissas de sua atuação, e que o desenvolvimento de políticas, que não apenas reduzam custos, mas também promovam melhores desfechos clínicos, sempre fez parte da formação técnica deste profissional. Ao participar da elaboração de diretrizes clínicas baseadas em evidências, o farmacêutico se faz um agente ativo na promoção da saúde.
Uma vez que a ATS se propõe ao monitoramento das tecnologias emergentes – com potencial aplicação no contexto de interesse, e na Oncologia existe certa frequência no uso off-label de medicamentos ou utilização de medicamentos importados, o farmacêutico possui competência técnica para a formulação de políticas institucionais nestes casos, visando assegurar que todas as práticas estejam em conformidade com as legislações e normas vigentes, minimizando riscos legais e promovendo a segurança dos processos.
Sendo assim, o agrupamento dessas informações compiladas pelo farmacêutico, quando realizado por um serviço estruturado e em consonância com os objetivos da organização, possibilita que desdobramentos ocorram para os times estratégicos e operacionais e contribui com a promoção de políticas e protocolos institucionais. A este respeito, apenas ter acesso não é suficiente. O acesso precisa estar respaldado clinicamente, sendo a alternativa que melhor beneficia aquele paciente, desde que haja também uma perspectiva de continuidade da utilização dessa tecnologia até que seja necessária. Nesse sentido, o estabelecimento de protocolos institucionais6, um processo multidisciplinar, agrega esses critérios e fortalece o discurso em uma área tão efervescente e estimulada quanto a Oncologia. A percepção da nova tecnologia e do seu posicionamento em uma linha de cuidado que, muitas vezes, é utilizada em combinação com agentes convencionais e produtos maduros no mercado tem como uma das principais entregas a promoção de uma incorporação realizada com transparência e, definitivamente, o farmacêutico é um profissional crucial nessa jornada.
REFERÊNCIAS
Por Dra. Andrea Pereira, coordenadora do Comitê Multiprofissional da SBOC
A obesidade é uma doença crônica, caracterizada por aumento da gordura corporal e por índice de massa corporal ≥ 30 kg/m2. Atualmente, ela acomete cerca de 41 milhões de pessoas (26% da população brasileira), porém segundo a World Obesity Federation haverá um aumento para 40% da população em 2035.(1–3)Em um levantamento de 24 anos de pacientes brasileiras com câncer de mama, em média 30% tinham obesidade ao diagnóstico, mais do que a prevalência na população geral. (4)
Vários parâmetros metabólicos ocasionam uma associação de obesidade com pelo menos 13 tipos de câncer entre eles: elevação da leptina, aromatase, lipólise, triglicérides, insulina, fator de crescimento vascular endoteliais (FCVE) e citocinas pró-inflamatórias e, redução da adiponectina e da estabilização do fator induzido por hipóxia (FIH1α). Além disso, temos a supressão da imunidade antitumoral, aumento da oxidação dos ácidos graxos das células cancerígenas e supressão das células T. (5,6) Todos esses fatores contribuem para uma maior prevalência de câncer em pessoas com obesidade.
Somado a maior risco, em geral, pacientes com obesidade descobrem o câncer de forma mais avançada. Isso ocorre devido ao preconceito dos profissionais da saúde em relação a eles, ocasionando menor solicitação de exames preventivos, atendimentos mais rápidos e ofensivos, afastando o paciente do serviço de saúde. Além disso, existe uma inadequação dos laboratórios e hospitais para a realização de exames em pacientes com obesidade. (7,8)
Durante o tratamento do câncer a obesidade reduz a resposta do mesmo e aumenta complicações: (9)
Em pacientes com câncer de próstata e obesidade existe um maior risco de mortalidade, probabilidade de ter o estadiamento subestimado na biópsia e diagnóstico mais tardio, comprometendo de forma significativa o prognóstico.(10)
Além da massa gorda, a redução da massa muscular com perda de funcionalidade, conhecida como sarcopenia, piora o prognóstico e qualidade de vida dos pacientes oncológicos, e aumenta efeitos adversos do tratamento. No caso da obesidade sarcopênica isso é ainda mais impactante, portanto, a avaliação da composição corporal é fundamental nesses pacientes.(11,12)
O tratamento da obesidade é multidisciplinar associando mudança de estilo de vida, alimentação saudável e equilibrada, prática regular de exercícios físicos, uso de medicação antiobesidade, acompanhamento psicológico e cirurgia bariátrica. (13–18)
A maioria dos estudos com paciente com obesidade e câncer falam de mudança de estilo de vida após o tratamento oncológico como medida de perda de peso, até porque o aumento do peso ou manutenção da obesidade, ocorrem geralmente em pacientes com câncer de mama, os demais pacientes perdem peso ao longo do tratamento. Porém, a obesidade requer um tratamento multiprofissional, com o uso de medicação, desde que não interagindo com o tratamento oncológico, desse modo, a semaglutida e tirzepatida são as mais indicadas e com melhores resultados no controle da obesidade. (19)
Em relação a cirurgia bariátrica, existe uma comprovação da sua eficácia na prevenção do câncer, devido a um efetivo controle da obesidade. Porém, devido sua interferência não conhecida na absorção das medicações oncológicas, não deve ser indicada antes do final do tratamento para o câncer. (18,20)
Concluindo, a obesidade é uma condição fundamental para um maior risco de câncer, pior resposta e prognóstico no tratamento oncológico. Portanto, o seu controle e tratamento são fundamentais para uma maior chance de cura e sobrevida nesses pacientes.
Referências:
1. Wharton S, Lau DCW, Vallis M, Sharma AM, Biertho L, Campbell-Scherer D, et al. Obesity in adults: A clinical practice guideline. Cmaj. 2020;192(31):E875–91.
2. Brasil. Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2019: Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquerito telefônico: Estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças não Transmissíveis. 2020. p. 1–277.
3. Obesity W, Board E, Assembly WH, States M, Day WO. World Obesity Federation ’ s response to WHO Discussion Paper ‘ Draft recommendations for the prevention and management of obesity over the life course , including potential targets ’ World Obesity calls on Membe r States to request WHO ’ s Executive Boar. 2020. p. 1–10.
4. Pereira AZ, Almeida-Pitito B de, Prado RR do, Mattar A, Hegg R, Shida JY, et al. Clinics in Oncology Overview of Obesity and Breast Cancer in Brazil : 24 Years. Clinics in Oncology. 2021;6:1–6.
5. Rathmell JC. Obesity, Immunity, and Cancer. New England Journal of Medicine. 2021 Mar 25;384(12):1160–2.
6. Brown KA. Metabolic pathways in obesity-related breast cancer. Vol. 17, Nature Reviews Endocrinology. Nature Research; 2021. p. 350–63.
7. Yung RL, Ligibel JA. Obesity and Breast Cancer : Risk , Outcomes , and Future Considerations. 2016;14(10):790–7.
8. Wee CW, McCarthy EP, Davis RB, Phillips RS. Screening for cervical and breast cancer: Is obesity an unrecognized barrier to preventive care? Ann Intern Med. 2000;132(9):697–704.
9. Zhao C, Hu W, Xu Y, Wang D, Wang Y, Lv W, et al. Current Landscape: The Mechanism and Therapeutic Impact of Obesity for Breast Cancer. Vol. 11, Frontiers in Oncology. Frontiers Media S.A.; 2021.
10. Langlais CS, Cowan JE, Neuhaus J, Kenfield SA, van Blarigan EL, Broering JM, et al. Obesity at diagnosis and prostate cancer prognosis and recurrence risk following primary treatment by radical prostatectomy. Cancer Epidemiology Biomarkers and Prevention. 2019;28(11):1917–25.
11. Liu C, Liu T, Deng L, Zhang Q, Song M, Shi J, et al. Sarcopenic Obesity and Outcomes for Patients with Cancer. JAMA Netw Open. 2024 Jun 14;7(6):e2417115.
12. Ligibel JA, Schmitz KH, Berger NA. Sarcopenia in aging, obesity, and cancer. Vol. 9, Translational Cancer Research. AME Publishing Company; 2020. p. 5760–71.
13. Wolin KY, Carson K, Colditz GA. Obesity and Cancer. Oncologist [Internet]. 2010;15(6):556–65. Available from: http://theoncologist.alphamedpress.org/cgi/doi/10.1634/theoncologist.2009-0285
14. Ligibel JA, Wollins D. American society of clinical oncology obesity initiative: Rationale, progress, and future directions. Journal of Clinical Oncology. 2016;34(35):4256–60.
15. Bianchini F, Kaaks R, Vainio H. Review Overweight , obesity , and cancer risk. Lancet Oncol. 2002;3(September):565–75.
16. Nagendra L, BG H, Sharma M, Dutta D. Semaglutide and cancer: A systematic review and meta-analysis. Diabetes & Metabolic Syndrome: Clinical Research & Reviews. 2023 Sep 1;17(9):102834.
17. Cuttica CM, Briata IM, DeCensi A. Novel Treatments for Obesity: Implications for Cancer Prevention and Treatment. Vol. 15, Nutrients. Multidisciplinary Digital Publishing Institute (MDPI); 2023.
18. Aminian A, Wilson R, Al-Kurd A, Tu C, Milinovich A, Kroh M, et al. Association of Bariatric Surgery with Cancer Risk and Mortality in Adults with Obesity. JAMA - Journal of the American Medical Association. 2022;327(24):2423–33.
19. Fischbach NA, Zhou B, Deng Y, Parsons K, Shelton A, Lustberg MB. Impact of semaglutide and tirzepatide administration on weight in women with stage I-III breast cancer. 2024.
20. Goldberg SL. Bariatric surgery and oral chemotherapy: Where is the dosing guidance? Vol. 129, Cancer. John Wiley and Sons Inc; 2023. p. 1800–2.
Por Dra. Karina Rodrigues Romanini Subi e Dra. Polianna Mara Rodrigues de Souza
Introdução
Priorizar alívio da dor em pacientes oncológicos é essencial. Estima-se que, no momento do diagnóstico, cerca de um terço dos pacientes já experimentam algum tipo de dor. Esse percentual ultrapassa 50% em algum estágio da doença e pode chegar a quase 70% nos casos em que a doença está avançada1.
A dor não controlada gera estresse fisiológico, o que influencia negativamente processos de reabilitação e recuperação, além de poder impactar diretamente os resultados do tratamento oncológico2. Os pacientes que sofrem de dor mal controlada tendem a apresentar redução na capacidade funcional, maior dependência, alterações de humor, isolamento social, distúrbios no sono, perda de apetite, dificuldades de locomoção e deambulação, além de uma percepção negativa da própria saúde. Isso se traduz em maior demanda por cuidados de saúde e, consequentemente, em aumento dos custos e diminuição da qualidade de vida1,2.
Já sabemos que o controle eficaz da dor e de outros sintomas contribui para a melhora da sobrevida global, aumenta a tolerância ao tratamento oncológico e aprimora a qualidade de vida dos pacientes3.
No entanto, muitas vezes, menos da metade dos pacientes com dor informa esse sintoma ao seu oncologista. Essa resistência pode ser motivada pelo receio de que a queixa de dor interfira negativamente no tratamento, ou pela crença de que sentir dor faz parte do processo da doença e que é algo inevitável2,4.
Infelizmente, cerca de 25% dos pacientes com câncer falecem com dor não controlada. Essa realidade evidencia o desafio de manejar a dor nesses pacientes, exigindo uma abordagem que inclua não só a aplicação de escalas adequadas para sua avaliação, mas também o entendimento da fisiopatologia da dor para o diagnóstico correto de sua origem, além do conhecimento dos princípios de farmacologia e das técnicas intervencionistas. Ademais, é fundamental considerar o caráter multifatorial da dor, o que requer a compreensão dos aspectos mais subjetivos, como a capacidade de acolhimento, a criação de vínculos e a avaliação biopsicossocial do paciente em diferentes fases do tratamento4.
Essa abordagem caracteriza a concepção de Dor Total, que engloba não apenas os sintomas físicos, mas também os fatores psicológicos, sociais e espirituais que geram um impacto multidimensional no sofrimento. Tal sofrimento não afeta somente o paciente, mas também seus familiares e cuidadores.
Manejo da Dor Oncológica - Abordagem Multimodal
O tratamento da dor oncológica deve ser multi e interdisciplinar, individualizado, com foco na avaliação contínua e ajuste das terapias conforme a resposta do paciente3,4.
A terapia farmacológica deve ser multimodal, utilizando diferentes classes de medicamentos para atuar em mecanismos distintos da dor, minimizando os efeitos colaterais e otimizando o alívio3,4.
A escada analgésica da OMS, mundialmente difundida, atualmente se constitui em medida educacional útil, porém não consiste em protocolo rigoroso para o tratamento da dor oncológica3. Ela norteia o manejo medicamentoso, porém outros estudos indicam uma tendência à supressão do segundo degrau, além da descrição de sugestões para a inclusão de um quarto degrau para locar as opções de intervenção. Essas alterações não têm por intuito negar o uso da escada original, que já se mostrou efetiva ao longo dos anos, mas tais adaptações se mostram necessárias para assegurar seu uso continuado com as inovações mais recentes em farmacologia e intervencionismo, sem perder sua simplicidade original, facilitando a disseminação do conhecimento em dor oncológica.
É recomendável o uso de opioides fortes como primeira linha de analgésicos para o tratamento da dor oncológica, sobretudo quando moderada a intensa4,5. Os opioides constituem o principal pilar do tratamento da dor oncológica e podem ser utilizados em todos os tipos de dor. Tal recomendação fica ainda mais embasada ao analisarmos sobre o uso controverso de codeína, devido à variabilidade na resposta individual ao fármaco. A metabolização da codeína pode ser afetada por fatores genéticos, levando alguns indivíduos a metabolizá-la rápido demais, o que pode resultar em toxicidade, enquanto outros podem não obter alívio da dor suficiente. Esses riscos tornam a morfina uma opção mais segura e confiável.
Adjuvantes
As medicações adjuvantes têm efeitos analgésicos indiretos e devem ser utilizadas para aprimorar a eficácia dos opioides, reduzir seu consumo, prevenir e tratar sintomas que possam agravar a dor, além de auxiliar no manejo da dor neuropática ou nociplástica3,4. Exemplos de medicamentos adjuvantes incluem anticonvulsivantes, antidepressivos tricíclicos e duais, corticosteroides, bisfosfonatos, neurolépticos e anestésicos locais. Embora os estudos sobre adjuvantes sejam predominantes na dor neuropática não oncológica, suas aplicações no contexto oncológico também têm mostrado resultados promissores.
Terapias Não Farmacológicas
A inclusão de fisioterapia, psicoterapia e práticas integrativas, como acupuntura e mindfulness, tem se mostrado eficaz no manejo da dor crônica e na melhora do bem-estar global dos pacientes4,5.
Terapias Intervencionistas
O tratamento intervencionista envolve a utilização de técnicas minimamente invasivas para o alívio da dor, podendo ser aplicado isoladamente ou em conjunto com a terapia medicamentosa. Essas intervenções podem resultar na eliminação ou na significativa redução do consumo de analgésicos, com a consequente diminuição dos efeitos colaterais associados a esses medicamentos4,5.
Infelizmente, essas abordagens ainda são frequentemente vistas como medidas de exceção, um equívoco que pode levar ao prolongamento do sofrimento do paciente e à perda do tempo ideal para a sua realização. Muitas vezes, os procedimentos intervencionistas são solicitados em estágios avançados da doença, quando o paciente já se encontra em situação clínica crítica ou em fase terminal, limitando a eficácia das intervenções e resultando em um benefício de curto prazo.
É crucial que a ausência de contraindicações gerais — como infecção, coagulopatia e recusa do paciente — seja sempre avaliada antes da realização de qualquer procedimento. Além disso, uma abordagem multidisciplinar e a consideração das preferências do paciente são fundamentais para garantir que as intervenções sejam realizadas no momento adequado, otimizando os resultados e melhorando a qualidade de vida do paciente.
A adoção mais ampla dessas técnicas pode não apenas melhorar o controle da dor, mas também reduzir a necessidade de tratamentos medicamentosos mais agressivos, promovendo um cuidado mais equilibrado e centrado no paciente.
Desafios e Barreira no Tratamento da Dor Oncológica
Apesar dos avanços no manejo da dor, muitos pacientes oncológicos continuam a sofrer devido a uma série de barreiras ao tratamento adequado, incluindo3,4:
- Estigma em relação ao uso de opioides: O medo de dependência e a relutância em prescrever opioides em doses eficazes são obstáculos comuns no manejo da dor.
- Acesso limitado a especialistas: Em muitas regiões, o acesso a cuidados especializados em dor ainda é restrito, limitando as opções de tratamento para pacientes com dor complexa.
- Educação inadequada: Pacientes e profissionais de saúde muitas vezes carecem de conhecimento sobre o manejo adequado da dor, resultando em sub tratamento.
Conclusão
O manejo adequado da dor oncológica, independentemente da sua intensidade, é crucial para a qualidade de vida dos pacientes com câncer. A utilização de uma abordagem multimodal, que combine opioides, analgésicos adjuvantes e terapias intervencionistas, pode proporcionar um alívio eficaz da dor e melhorar o bem-estar físico e emocional dos pacientes. Contudo, é necessário um esforço contínuo para superar as barreiras ao tratamento e garantir que todos os pacientes recebam cuidados adequados e individualizados.
Referências
3. Portenoy RK, Mehta Z, Ahmed E. Cancer pain management: General principles and risk management for patients receiving opioids. UpToDate. Retrieved Oct 10, 2024. Available: https://www.uptodate.com/contents/cancer-pain-management-general-principles-and-risk-management-for-patients-receiving-opioids
A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) é a entidade nacional que representa os médicos oncologistas clínicos. Fundada em 1981, a SBOC tem como um dos seus princípios a valorização da ciência e, nesse sentido, reprova a disseminação de informações falsas.
Uma em cada três publicações sobre câncer nas redes sociais contém informação incorreta, segundo o National Cancer Institute (NCI). O alerta da principal agência norte-americana para pesquisa do câncer corrobora com o que tem sido observado pela SBOC, que ao longo deste ano foi contatada diversas vezes pela imprensa para desmentir fake news ou explicar associações equivocadas a partir de postagens de grande repercussão nas redes sociais.
O câncer de mama é uma doença multifatorial e resultado da multiplicação desordenada de células anormais da mama, ou seja, uma disfunção celular. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), a projeção de novos casos de câncer de mama, somente no Brasil, deve ultrapassar 74 mil diagnósticos até 2025. Este tipo de neoplasia é considera hoje a mais comum entre as mulheres no País.
Entre os recursos aliados para a detecção precoce do câncer de mama, está a mamografia – exame que gera imagens de alta qualidade capazes de revelar a existência de sinais iniciais da doença. O exame, geralmente, é indicado para mulheres a partir dos 40 anos, independente da presença de sintomas. Quando se detecta alterações pré-malignas e tumores mamários muito pequenos, o que é possível a partir da mamografia, as chances de cura do câncer de mama são de aproximadamente 95%.
É importante ressaltar que pacientes e seus familiares frequentemente recebem informações que não são respaldados pela comunidade científica, inclusive de fontes não especializadas em saúde. Hoje existem terapias eficazes e seguras para a maioria dos tipos de câncer. Substituir terapias comprovadas por alternativas sem evidência científica pode colocar o paciente em risco de vida e de toxicidade.
Em seu site, a SBOC disponibiliza uma página especial com infográficos que destacam os principais métodos cientificamente comprovados para reduzir o risco de câncer. Para mais detalhes, acesse: https://sboc.org.br/prevencao
Bacharela em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (USP), em 1994, Dra. Anamaria Camargo tornou-se doutora em ciências, em 1997, pela mesma instituição, pesquisando a biologia da relação patógeno-hospedeiro.
Desde o início de suas atividades científicas, tem se dedicado ao estudo da organização genômica de diversos organismos. Entre 1997 e 2000, participou da coordenação do Projeto de Sequenciamento do Genoma da bacteria Xylella fastidiosa e, entre 1999 e 2000, do Projeto Genoma do Câncer Humano. Também teve participação ativa na Rede Nacional de Sequenciamento de Genomas Bacterianos formada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.
Atualmente, atua no Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa como coordenadora do Centro de Oncologia Molecular e gerente de pesquisa. Tem como principal linha de pesquisa o estudo de alterações genéticas e epigenéticas que ocorrem na célula tumoral, visando o desenvolvimento de novas ferramentas para o diagnóstico, o prognóstico e o tratamento da doença.
Já recebeu os prêmios Mérito Científico e Tecnológico do Estado de São Paulo, concedido pelo governo estadual em 2000, e o Octávio Frias de Oliveira, concedido pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), em 2020, na modalidade Personalidade de Destaque em Oncologia.
Ingressou na Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) em 2024, para fazer parte do Comitê de Oncogenômica da entidade. Por sua extensa dedicação à ciência, Dra. Anamaria Camargo foi agraciada com o Prêmio Bernardo Garicochea de Pesquisa Oncológica Translacional – rebatizado neste ano em homenagem ao pesquisador falecido em 11 de outubro último. A categoria enaltece quem é reconhecido por sua contribuição à pesquisa translacional com aplicação na oncologia clínica.
Dra. Anamaria Camargo e os demais contemplados pelos Prêmios SBOC 2024 serão homenageados na sessão plenária do XXV Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica, que acontecerá no dia 8 de novembro, às 16h45, no Rio de Janeiro.
Nos anos anteriores, receberam essa premiação Dr. Alessandro Leal (2019), Dr. Carlos Gil Ferreira (2021), Prof. Dr. Roger Chammas (2022) e Dr. Rodrigo Dienstmann (2023).
BOX
A SBOC conversou com Anamaria Camargo e fez a ela três perguntas sobre a sua carreira como oncologista clínico. Confira a seguir:
Como a pesquisa translacional surgiu na sua vida?
Durante o meu pós-doutorado realizado no Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer e Hospital A.C.Camargo. Neste período, aprendi que a ciência vai além de gerar conhecimento e que o conhecimento precisa ser transformado em cuidado.
Na sua opinião, qual será o futuro dessa especialidade?
A oncologia será cada vez mais personalizada e multidisciplinar e o câncer será controlado e tratado como uma doença crônica.
Uma frase, música ou poema que te inspire?
“A ciência ensina o amor pela verdade e a necessidade do trabalho, não como um castigo, mas como o mais elevado meio de empregar a sua atividade”. De Marcelin Berthelot – professor, químico e político francês.
O Grupo NotreDame intermédica/HapVida, em Jundiaí (SP), busca um oncologista clínico para integrar a sua equipe no atendimento ambulatorial, com pagamento acima do valor de mercado e agenda flexível. Interessados devem enviar o currículo em Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. ou (11) 94370-5560
O Grupo NotreDame intermédica/HapVida, em Sorocaba (SP), busca um oncologista clínico para integrar a sua equipe no atendimento ambulatorial, com pagamento acima do valor de mercado e agenda flexível. Interessados devem enviar o currículo em Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. ou (11) 94370-5560